análise do poema A MENSAGEM, de DE FERNANDO PESSOA
1ª. estrofe ou estância
Deus quer, o
homem sonha, a obra nasce ……… 1 verso *
Deus quis que a terra fosse toda uma,……………… + 1 verso *
Que o mar unisse, já não separasse. …………….. + 1 verso *
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,…….. + 1 verso *
2ª.estrofe ou estânciaDeus quis que a terra fosse toda uma,……………… + 1 verso *
Que o mar unisse, já não separasse. …………….. + 1 verso *
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,…….. + 1 verso *
E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir,* redonda, do azul profundo.**
3ª.estrofe ou estância
Quem te sagrou criou-te português.
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!
·
* 4 Versos
compõem UMA QUADRA.
·
Cada estrofe/estância
é o conjunto de versos
Trata-se de um poema da segunda parte – Mar Português – da Mensagem- colectânea
de poemas de Fernando
Pessoa, escrita
entre 1913 e 1934.
Esta obra
contém poesia de índole
épico-lírica. Épica porque dos descobrimentos, exaltação
heróica; a evocação dos perigos e dos desastres bem como a matéria histórica
ali apresentada. Na dimensão lírica, é a forma fragmentária da obra, o tom menor, a interiorização da matéria épica, através da qual o sujeito poético se exprime.
Refere: o esforço heróico na luta contra o Mar e a ânsia do Desconhecido. Merecem especial atenção os navegadores que percorreram o mar, cumprindo um dever individual e patriótico.
O poema é constituído por três estrofes, de
quatro versos (quadras).
Os versos são
decassilábicos heróicos. (10, de exaltação heróica)
Predomina o
ritmo ternário, aparecendo também o binário.
A rima é sempre cruzada, segundo o esquema de rima (rimático)
abab, cdcd, efef, permitindo que certas palavras chave do poema fiquem em posição de
destaque, no fim dos versos, como nasce uma, mundo, português, sinal,
Portugal.
O poema divide-se em
três partes, conforme o desenvolvimento
do assunto: A primeira correspondendo ao primeiro verso; A segunda parte desde ali até ao final da segunda estrofe. A terceira constituída pela última estrofe.
Na primeira está contido uma afirmação tripartida:
“Deus quer/, “o homem sonha/, “a obra nasce/”.
Sem a vontade do primeiro nenhum dos outros se concretizaria. Se Deus não quisesse, o homem não sonharia e a obra não nasceria.
O sentido da
afirmação tem valor universal: o substantivo homem refere-se ao ser humano e a obra designa qualquer acção humana. Note-se o uso do presente.
A segunda parte
poderá subdividir-se em três momentos. A primeira
subunidade diz respeito à
apresentação da vontade de Deus e vai até “sagrou-te”. Deus quer a terra unida
pelo mar.O valor simbólico do verbo “sagrou-te”, sugerindo o Infante de Sagres e a escolha do Infante para uma missão divina. Tem ainda grande força pelas suas conotações religiosas.
O mar por sua vez é também simbólico do mistério e do desconhecido, por isso a expressão: “desvendando a espuma” (desfazendo o mistério).
O segundo momento referir-se-á ao homem e vai até ao fim da primeira quadra. Aqui se desenvolve a ideia de que o homem sonha e põe em prática a vontade de Deus. No poema esse homem identifica-se com o Infante. Ele é o herói navegante em busca do caminho da imortalidade, cumprindo um dever individual e Pátrio: a realização terrestre de uma missão transcendente. Por outro lado é também o herói em busca de um caminho de universalidade.
Justifica-se o uso do artigo definido em O INFANTE. Ele é o escolhido por Deus para concretizar o seu projecto. Isto confere-lhe um carácter divino. Ele é aquele que sonha, que tem a visão e finalmente foi “desvendando a espuma”, ou seja realizou a obra.
Pelo facto de ser português, a sua escolha para desempenhar uma missão transcendente, a sua sagração é também a de todos os portugueses. Nesta parte aparece ainda a passagem do mistério para a luz, nas palavras “orla branca” “clareou” (sair das sombras, revelar-se) já adivinhada na “espuma”(branca) da segunda parte e que se prolongará pelo “surgir* ”(sair das sombras, revelar-se) e pelo azul profundo**” (do mar imenso, do fundo do mistério).
A terceira vai até ao final desta segunda parte e refere-se à obra e corresponde à revelação. Há no poema vários indícios de revelação “ de repente”, “surgir”, “o azul profundo” e na terceira estrofe “sinal”. A revelação é repentina, espectacular, miraculosa. Tal é sugerido pela expressão “E viu-se a terra inteira, de repente,/ surgir , redonda, do azul profundo”.
A visão da terra sugere-me a ideia de que a obra dos portugueses é o realizar de um plano divino. O redondo, a esfera, é o símbolo da perfeição cósmica, da obra completa e perfeita que Deus quis.
Ao longo desta segunda parte o tempo verbal predominante é o pretérito perfeito, assim permite narrar os acontecimentos passados.
Na terceira parte transpõe-se para o povo a glória do Infante.
Conclusão: O povo português foi o eleito por Deus para esta façanha.
O sonho cumpriu-se (tese), desfez-se (antítese) e deu lugar a um novo sonho (síntese). Este esquema dialéctico cíclico impõe o nascimento de um novo sonho, mas tal só se pode verificar se “ o Senhor” corresponder ao apelo que lhe é dirigido na frase exclamativa e em forma de vocativo “Senhor, falta cumprir-se Portugal!”. Teríamos assim uma nova vontade divina, um novo sonho e uma nova acção.
Aqui há um diálogo entre o sujeito poético e Deus, o que acentua o carácter messiânico e misterioso do poema. Esta estrofe regressa ao presente o que se adequa à sucessão presente-passado-presente da dinâmica hegeliana.***
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