sábado, 8 de março de 2014

À MULHER NO DIA INTERNACIONAL DA MULHER (reeditado)


À MULHER, A TODAS AS MULHERES, DE UM MODO ESPECIAL À MINHA SAUDOSA MÃE , AQUI FICA A MINHA HOMENAGEM:

Falar do dia Internacional da Mulher, é falar das mulheres de todo o Mundo, nas mulheres de ontem e de hoje. Todas merecem o nosso respeito. Muitas ficaram e muitas ficarão na História da Humanidade. Impossível lembrar todas, mas aqui fica a intenção.
Pensativa, quedei-me por um instante.


A minha caneta também parou no papel. Olhou para mim com olhos impacientes, como que a perguntar:
- Com tantas mulheres que merecem ser lembradas neste dia, como podes enumerá-las? Impossível, tarefa impossível Celeste. 
- É verdade caneta amiga, tens razão. Não sei por onde começar.
- Olha, por que não começas por Eva, a primeira mulher?
- Para quê? Quem não sabe que Eva foi a companheira de Adão no paraíso e que... Olha, não preciso de me alongar nesta conversa.
- E se falares de Maria, a virgem que foi Mãe de Jesus Cristo? indaga a caneta muito interessada.
- Quem sou eu para falar de Maria, quando poetas e escritores, desde há mais de 2000 anos, dela têm escrito?
- E se mencionares a Raínha Santa Isabel de Portugal, que levava esmolas para os pobres e estas se transformaram em rosas no seu regaço, quando D. Dinis, seu marido, lhe perguntou o que levava? - atirou-me já um pouco impaciente a minha caneta.
- Bem, tens razão. Espera. Lembrei-me agora de uma mulher extraordinária, absolutamente especial. Chama-se Madre Teresa de Calcutá. Mas, se falar dela, terei de falar de muitas Madres Teresas espalhadas por este mundo fora, mulheres que fazem o bem e não se sabe, porque há muitas maneiras de fazer o bem.
A minha caneta passou a língua pelos lábios e sorriu. Será que se tinha lembrado de alguma mulher especial? Mas ficou calada, com aquele sorriso trocista, como quem diz: puxa pela cabecinha menina Celeste. Vá.
- Fiquei indecisa por uns momentos, mas tenho de continuar. De quem hei-de falar agora, neste dia especial dedicado às mulheres, às mulheres de todo o Mundo? Deixei escapar a pergunta olhando de lado para a caneta, que não se comoveu, entretida que estava a picar o papel. Estava entregue à minha sorte, à minha memória, ao meu conhecimento, por que não vi na caneta vontade de colaborar.
- Se escrevesse sobre mulheres que se distinguiram na política, como a Raínha D. Maria de Portugal, Benazir Butho (que homens mal intencionados mataram), de... Mas os nomes não me ocorrem, que maçada.
Comecei a notar a caneta toda a tremelicar de satisfação, desejosa de intervir. Acabou por abrir o bico:
- Por que não falas sobre mulheres como Florbela Espanca, Sophia de Mello Breyner Andresen, Glória de Sant'Anna, Noémia de Sousa, Alda Lara, e dos seus livros de poesia, mulheres da cultura. Numa Beatriz Costa, Maria Matos, Amélia Rey Colaço, no teatro português, Edith Piaff e Amália Rodrigues, vozes da canção que tão alto elevaram os nomes dos seus países?
- Boa lembrança querida caneta. E mais? Vá, lembra-te de mais, diz depressa. A caneta elevou a voz e um pouco pretensiosamente atirou-me à queima roupa:
- Ó Celeste Cortez, porque não abres o teu coração? Ai Celeste, Celeste.
- O meu coração? O que tem isso a ver com nomes de mulheres que devo homenagear?
- Claro que tem. Às vezes não tens todas as lembranças na mente, as melhores lembranças tens no teu coração, eu conheço-te. Abre o teu coração Celeste. E com a mão fez um trejeito à frente da sua boca, como se estivesse a fechar um fecho "éclair", indicativo de que os seus lábios ficavam fechados, que não tinha intenção de colaborar comigo.Abri a porta do meu coração devagarinho, sem ter a certeza de que tinha ali alguns nomes. Fui abrindo e espreitando ao mesmo tempo. Afinal no seu interior havia tantos, tantos nomes! Continuei a abrir suavemente, com receio de deixar sair alguns sem eu os ver. Mas não, não saíram. 
O que foi saindo foi o meu reconhecimento por todas as mulheres, desde a mulher menos famosa por ser em muito maior número, mas não menos necessária para o andamento do mundo: a mãe, a dona de casa, a engomadeira, a cozinheira, lavadeira, jardineira, a mulher que trabalha na fábrica, na padaria, na caixa dos supermercados, a advogada, engenheira, cabeleireira, empregada de escritório, a modista, a mulher da lavoura e muitas, muitas mais. Mulheres que abnegadamente executam as tarefas do lar, ajudam a educar os filhos e que, só muito raramente ouvem um elogio dos que amam.
Desenho de Michael Veloso. Respeite os direitos autorais
Mulheres do nosso tempo, que tendo que deixar os filhos entregues em creches e escolas, saem de manhã cedo para o trabalho, e no regresso, num corre corre vão ao supermercado fazer as compras, vão à creche, à piscina ou onde os filhos estão para regressarem ao lar e ainda tendo que lavar, limpar, cozinhar e dar amor aos que a rodeiam, esquecendo-se que também elas precisam de carinho e de descanso.
Nem o maior jornal do mundo, nem todas as televisões comportariam tanto elogio, a todas as mulheres, que deram à luz todos os cidadãos do mundo.
A minha caneta, pôs-se em bicos de pés e num beijo todo remelão, ia a dizer-me que eu, afinal, tinha muitas mulheres no meu coração. Não lhe dei tempo para se esticar mais, porque nesse momento, eu quis homenagear todas as Mulheres da minha família, desde tempos passados até ao presente. As que estão neste mundo, mas, de um modo especial aquelas que me recordo terem partido. E todas deixaram saudades. Algumas partiram recentemente. O meu coração enumerou-as, mas não vou deixá-las nesta folha escrita, prefiro que continuem dentro do meu coração para sempre.
Um soluço de saudade saiu do meu coração para deixar espaço para ali voltar a colocar todos os nomes.
A minha caneta, voltou a esticar-se em bicos de pés, trepou devagarinho até à minha face. Com o seu lencinho etéreo, limpou uns cristais que estavam a cair dos cantos dos meus olhos, e disse-me baixinho: Contei tantas, tantas! Eu sei, a última lágrima foi de saudade pela tua MÃE.

Celeste Cortez (publicado no Jornal "Página Beirã", a 16 de Março de 1995).

PS. Referi no presente Madre Teresa de Calcutá, porque este meu artigo foi publicado no jornal "Pàgina Beirã" em 1995. Madre Teresa veio a falecer em 1997. 





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