O ELOGIO DA
LÍNGUA
PORTUGUESA
No elogio que fez da língua portuguesa, escreveu Francisco Rodrigues
Lobo que o nosso belo idioma é brando para
deleitar, grave para engrandecer, eficaz para mover, doce para pronunciar e breve para
resolver. Para falar é engraçado com
modos senhoris, para cantar é suave e sentimental; para pregar é sóbrio, com uma gravidade que autoriza
as razões e as sentenças; para escrever é
generoso de vocábulos.
A pronunciação não obriga a ferir o céu-da-boca com aspereza, nem a
arrancar as palavras com veemência do gargalo. Escreve-se da maneira que se lê,
e assim se fala. Tem de todas as línguas o melhor: a pronunciação da latina, a origem
da grega, a familiaridade da
castelhana, a brandura da francesa e
a elegância da italiana.
Só uma língua rica e pujante permitiria a Rodrigues Lobo uma
caracterização tão fiel e atraente.
A língua portuguesa tem sido ao longo de toda a valorosa e extensa
vida da comunidade lusa o estado onde se alicerça toda a epopeia lusíada.
Fundadores, povoadores conquistadores, descobridores, homens da arte e da
ciência, estadistas e evangelizadores usaram-na para dilatar a fé e promover o
progresso das gentes das sete partes do Mundo.
O nosso idioma universalizou-se. É hoje falado por 273 milhões de
pessoas, sendo 250 milhões nativos. É a 5ª. língua materna mais falada do Mundo
e o idioma oficial de 9 países. Expressam-se na nossa língua materna falantes
europeus, africanos, asiáticos e americanos. Tantos e tão belos poemas e prosas
têm tido como suporte o português.
E tem vida. Evolui de forma natural, quer concebendo novas palavras,
quer absorvendo vocábulos estrangeiros, aportuguesando-os. É um processo
dinâmico que a vivifica, actualiza, enriquece e a torna num precioso
instrumento da vivência dos povos.
Constitui para os portugueses, metaforicamente falando, o metro padrão universal para reduzir ao
infinitesimal a possibilidade da sua alteração morfológica. Deverá ser
intocável na sua arquitectura, com as excepções decorrentes das lógicas
adaptações impostas pelo natural processo evolutivo do seu percurso temporal.
Não posso por isso conceber que, de forma abrupta, a brutalizem com
amputações ou alterações por meio de uma cirurgia estética importada.
O novo acordo ortográfico, em nome da uniformização da expressão, não
é mais do que um bisturi agressor do tecido congénito da língua portuguesa.
Para agressão basta-nos os atropelos, o seu desconhecimento e o deficiente
emprego a que a sujeitam.
Na minha opinião, a uniformização deve procurar-se na fonte, no berço da
sua criação e não nas adulterações importadas.
Um notável líder angolano declarou, publicamente, orgulhar-se de falar
a língua portuguesa tal como ela hoje existe, recusando-se a abrasileirar o
idioma luso.
E têm aqui cabimento as palavras finais do elogio que Rodrigues Lobo
fazia da língua materna:
… Só um mal ela tem: e é que,
pelo pouco que lhe querem os seus naturais, a trazem mais remendada que a capa
de pedinte.
Carlos Brandão de Almeida - 2013-02-02