Mais um artigo do meu amigo Carlos Brandão de Almeida. Como sempre, com um final que dá para pensar. Não devemos menosprezar os avisos sensatos e prudentes. Pautar a nossa consciência pela honradez, pelo jogo limpo.
Numa
manhã soalheira, avistaram uma cria de javali que por ali, despreocupadamente,
saltitava.
Logo
imaginaram, no pequeno cerdo, a gostosa refeição por que tanto ansiavam. E,
rapidamente, prepararam as armas assassinas.
Um
deles, porém, adverti-os para o perigo de matar o imberbe animal pois seria de
esperar uma violenta retaliação por parte da restante vara.
-
Tenham cuidado! Olhem que o javali selvagem é uma fera muito perigosa.
Os
dois outros caminheiros, todavia, ignoraram a advertência do companheiro. E
como a fome já lhes toldava o raciocínio, decidiram mesmo executar a sentença.
O condenado foi então executado e serviu de opíparo manjar aos dois carrascos.
Saciados
da fome, os regalados comensais deitaram-se e adormeceram profundamente.
O
que não tinha participado no banquete, com a barriga vazia, estava meio
entorpecido quando ouviu um tropel de animais. Receoso, subiu a uma árvore e
dali viu, angustiado, uma vara de javalis rodear os dois companheiros que
dormiam o sono dos justos. Destacou-se o animal mais corpulento – seria a mãe
da cria – que se aproximou dos dorminhocos e cheirou-os na boca. Facilmente
farejou o cheiro da carne do seu filhote. Furiosa, trespassou-lhes de uma só
dentada as artérias carótidas e, com os outros javalis, esquartejaram
selvaticamente os corpos dos homens.
Horrorizado
com aquele sanguinário espectáculo, o caminheiro sobrevivente só muito mais
tarde desceu da árvore e se afastou o mais depressa possível. Com fome, mas
vivo!...
A
sua ponderação, afinal, salvara-lhe a vida.
Na
vida, desprezamos algumas vezes, com arrogante sobranceria, as sentenças
sensatas, os conselhos prudentes e cometemos, por isso, erros que nos mancham a
consciência, sujando-nos interiormente.
Essa
sujidade, mais tarde ou mais cedo, poderá
vir a marcar o nosso carácter e a revelar-se no nosso comportamento, maculando
as relações com os outros.
Até
que um dia podem surgir uns revoltados javalis…
Carlos Brandão de Almeida
2012.07.25
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