Registrada em 06 de abril de 2009
A ALACIB é uma Associação Literária sem fins econômicos, com sede e foro em Mariana, Minas Gerais, CNPJ 10778442/0001-17. Tem por objetivo a difusão da cultura e o incentivo às Letras e às Artes, de acordo com as normas estabelecidas no seu Regimento. Registrada em 06 de abril de 2009.
Diretoria da Academia de Letras, Artes e Ciências Brasil
Presidente: Andreia Aparecida Silva Donadon Leal
Vice-Presidente: J.S. Ferreira
Secretário-Geral: Gabriel Bicalho
Tesoureiro: J. B. Donadon-Leal
Promotora de Eventos Culturais: Hebe Maria Rôla Santos
Conselho Fiscal e Cultural: José Luiz Foureaux de Souza Júnior, Magna das Graças Campos e Anício Chaves
Acadêmica CELESTE CORTEZ
Cadeira nº 08
Classe - Correspondente estrangeira
Lisboa - Portugal
Notas Biográficas de Celeste Cortez
Celeste Almeida de Campos Cortez Silvestre, natural de Carregal do Sal, Portugal. Diplomada pelo Instituto E. A. of South Africa. Certificado da WITS, hoje Universidade de Joanesburgo, em curso para adultos. Foi professora de português na África do Sul, professora de inglês em Portugal. Empresária na África do Sul e em Portugal. Autora de romances e poesia, professora de poesia, saúde pela natureza e estudos africanos. Coordenadora de eventos culturais. Mentora cofundadora e vice presidente da A.G. da USCSAL – Universidade Sénior; Académica e secretária da A.G. da ALA – Academia de Letras e Artes, de Portugal; Académica correspondente da ALACIB – Academia de Letras, Artes e Ciências Brasil. Publicou livro de aldravias - Cântico de Palavras - Blog: http://celestecortez.blogspot.com - Email: celeste.cortez....@.....com
Quero ser escritora
De cada vez que leio um livro fico a pensar que seria capaz de escrever assim. E se experimentasse? Peguei na minha caneta nova. O seu bico pontiagudo ficou inerte na folha de papel branco. Acreditem, nem sequer se mexeu! Ora se outras pessoas escreviam – algumas escreviam romances de que eu tanto gostava – é porque a caneta delas sabia escrever. Porque não a minha? Olhei para a caneta impaciente e da minha boca saiu uma palavra de comando:
- Anda, escreve. Mas o bico pontiagudo não se moveu.
- Estás com preguiça? Trabalha, começa a escrever, eu quero ser escritora. Ouviste? Escritoraaaaaa…
- Deves estar a delirar. Para eu me mover é preciso que tu me faças andar.
- Como quem dá corda a um brinquedo? Como quem dá a mão a uma criança para ela dar os primeiros passos?
- Isso não sei, nunca fui um bico escritor. Compraste-me ontem, novinha em folha, não nasci ensinada! Nenhuma caneta nasce ensinada.
Estou certa que os escritores compram canetas especiais que têm toda a sabedoria, é só deslizar o seu bico no papel e aparece o livro feito num instante. E se conseguisse falar com um deles para me informar onde comprar essas canetas? Até talvez tenham alguma para vender. A minha caneta ouviu. Com ar reprovador e de maus modos respondeu-me:
- Achas que os escritores vendem canetas que escrevem sozinhas? Se isso fosse possível guardavam-na a sete chaves… para escreverem, escreverem, escreverem... Nunca mais paravam de escrever!
- Pois aí está. Comprei-te precisamente na papelaria mais cara da cidade, convencida que tinhas a sabedoria toda, que o teu
bico saberia escrever poesia, romances, livros de contos, livros infantis, livros de ensino, a História Universal, livros para todas as Universidades do Mundo incluindo as Universidades Seniores, livros de histórias aos quadradinhos….
- Quem está a ver aos quadradinhos és tu, respondeu-me com azedume. Se as canetas nas lojas tivessem sido ensinadas a escrever eu também saberia fazê-lo, ou pensas que sou menos que as outras? Já te disse, não há canetas que saibam escrever sozinhas, têm de ter uma mão que as guie no papel.
- Ó que desilusão! E eu a pensar que escreverias por mim um romance, muitos romances, livros de poesia, livros para crianças e outros livros! Que eu só assinaria o meu nome na última página! E claro, publicaria a minha melhor foto na contracapa de cada livro para que toda a gente me conhecesse! Para ser famosa, receber prémios de literatura no meu país e no estrangeiro, por fim receber o prémio Nobel! Já viste onde o meu ego iria parar?
- O teu ego não sei, mas tenho a certeza que serias a pessoa mais vaidosa do mundo. Não delires. Desce à terra.
- Na terra estou eu sua respondona, não preciso de ti para nada nem do teu bico que nem sequer sabe escrever quanto mais imaginar! Esse bico é um pau mandado, precisa de mim para escrever. Baixei a voz: Ela vai ver quem eu sou, lambisgóia de bico afiado!!!
Depois de dar corda ao bico paspalhão, dei-lhe ordem quase gritada do alto do meu metro e sessenta mal medido. E como me deu prazer! Era eu quem comandava. Ia ser escritora. Uau!
- Escreve o que eu ditar e escreve depressa sua… Ia chamar-lhe um nome forte, mas fiquei-me por um mais suave: Sua, sua caneta de bico desafiado. E baixando o tom: Sua delambida intrometida.
A caneta olhou para mim de esguelha enquanto colocava o bico pontiagudo no papel e eu, guiando-a, puxava pela minha imaginação. Vá, escreve: “Para se ser escritor, ou melhor escritora, é preciso começar a escrever letras.
- Só letras? perguntou olhando-me de soslaio. Isso é fácil, o alfabeto tem vinte e seis letras. É o abecedário: a, b, c, acrescentou toda ufana, convencida!
- Caluda, sua malcriada, não se interrompe quem está concentrado. Daqui a pouco dou-te um puxão de orelhas, sua atrevida.
- Um puxão de orelhas? Ainda nem reparaste que não tenho orelhas? E quanto a concentração, achas que é precisa para escrever letras? Já te disse que são apenas 26 letras do alfabeto...
- Psiu!! Quando um burro fala o outro baixa as orelhas. Arrependi-me de imediato do que dissera: Queria chamar burra à caneta e acabei por me apelidar de asno, ou asna, sei lá. Que raiva.
Ouvi rir duma maneira esquisita, da maneira que se riem as canetas parvas. Não valia a pena objetar, caso contrário não finalizaria a escrita. Às vezes é preciso condescender. Coloquei um pouco de mel na voz e pedi à caneta se… “fazia o favor“ de recomeçar a escrever o que eu lhe ditasse. Ela, sorridente, obedeceu.
Continuei a puxar pelas ideias:
Juntam-se letras que por sua vez formarão palavras, quer dizer que a escrita é uma sucessão de palavras. As palavras farão frases, é como numa dança, uma dança de muitas palavras que enviamos para a mente e esta constrói um enredo. Ser escritora é ter gosto pela escrita, ter imaginação, memórias, visões. São os escritores e as escritoras que levam a caneta a fixar as histórias no papel ou levam os dedos a escrevê-las no teclado. E como podem ser fascinantes! Fascinante é pois o caminho da palavra e da escrita.
Sentia a imaginação a inundar o meu cérebro, as palavras fervilhavam dentro da minha cabeça a fazerem esforço para se ultrapassarem e chegarem primeiro ao papel. Os meus dedos pressionavam com garra a caneta e esta ia escrevendo o que eu queria. Às vezes parecia-me que estava a ficar cansada, mas não me preocupei, escrever era a sua “sina”.
Continuei feliz dando asas à imaginação: Ser escritora é fazer o tempo andar para trás, andar para a frente ou fazê-lo parar, marcando encontro com personagens e lugares, com o visível e com o invisível. Encontros fictícios ou verdadeiros. As escritoras levarão dias e muitas vezes noites, a construir frases que às vezes mudam de lugar, para de novo as colocar aonde estavam, como uma indecisa jogadora de xadrez. São noites que se encontram com a madrugada. São dedos que se cruzam no teclado, ou canetas que ficam sem tinta e...
- Vais-me deitar fora quando tiver falta de tinta? Ao meu lado ouço a voz sofredora da caneta perguntar-me, com receio de um qualquer dia ir parar ao lixo.
- Não, não quis dizer isso, não só porque tens muita tinta mas porque me afeiçoei a ti, mas por favor não me interrompas, estou no melhor das minhas ideias. Anuiu, sorrindo agradecida.
Recomecei: São dores musculares que só se sentem quando a escritora se deita, porque com o entusiasmo nem dá por elas. E se dá, não convém que pare. São frustrações de não chegar onde se anseia, de não fazer mais por não ser possível no tempo de que dispõe. São humilhações por as editoras editarem uns e deixarem outros sem resposta. É marcar um encontro com a escrita num determinado lugar e quando chega o lugar estar ocupado, por vezes por alguém que não o merece. A escritora faz uma perspetiva do mundo e pode virá-lo do avesso.
- Virá-lo do avesso, virar o mundo do avesso? Ainda gostava de saber como seria o mundo virado do avesso, minha amiga senhora dona feita escritora.
- Psiu, deixa-me continuar, não me interrompas por favor. Ditando devagar e com voz mais amável continuei: Nem sempre se consegue ser boa escritora, mas o caminho faz-se caminhando. Melhor será se houver engenho e arte, mas já é andar logo que se vão tateando os primeiros passos. É preciso cultivar um salutar desejo de escrever se se quer atingir um ponto mais elevado. Apesar de tudo o que fica escrito e o que ficou por escrever, apesar de todas as frustrações porque passa, a escritora sente-se realizada. Inventa o amor para os seus personagens serem felizes, quantas vezes ansiando por dois braços que sejam berço para se embalar. Inventa dias deslumbrantes e noites inebriantes para esses personagens, imaginando aconchegar-se no colo amado para adormecer. Para eles inventa melancolias, mágoas, aflições, tristezas e chora com eles. Apesar de tudo, a criadora de palavras escritas, de frases feitas que conseguem ser lidas e gerar emoções, é feliz. Abriu o seu coração aos amigos e aos desconhecidos a quem chama leitores. Partilhou com quantos foi possível. Como gostaria de partilhar com o mundo todo. Sentir-se-ia mais rica, mais completa.
- Puxa, pára aí, interrompe a minha caneta em bicos de pés para chegar ao meu ouvido como quem segreda uma bela notícia. Para quem não sabia o que dizer… não está… Não digo! Não digo! Não digo! Não quero que te envaideças, os humanos são muito convencidos!!!
O meu coração abriu-se num sorriso feliz. Abraçámo-nos ternamente. Iríamos ser amigas inseparáveis para a vida.
Edição em 06 de fevereiro de 2019 por J. B. Donadon-Leal