quinta-feira, 14 de março de 2019

A ESPERTEZA DO OLEIRO

A ESPERTEZA DO OLEIRO, por Carlos Brandão de Almeida

História ficcionada, como lhe chama o autor. Ele leva-nos a acompanhá-lo ensinando-nos como proceder, o que mais nos parece pura realidade. 
Desejo que gostem tanto deste artigo como de todos os outros escritos pelo mesmo autor. Para ele, o meu obrigada, Carlos. 


Requelindo, oleiro de profissão, tinha herdado de seus pais uma casa. Era uma vivenda airosa situada perto das arribas do litoral sintrense. A paisagem que se desfrutava do morro, vendo e ouvindo o clamor do  irrequieto oceano era um deslumbramento. Tinha um florido jardim à  frente e, na rectaguarda, um pequeno quintal no qual fora construído  um exíguo anexo. O Requelindo ali guardava todas as peças de olaria  que, pacientemente, ia moldando mas que não conseguia vender.

Naquele difícil ano, o turismo fraquejara e o negócio da venda das  
figuras de barro fora ruinoso. A má fortuna batera-lhe à porta e o  
esforçado oleiro viu-se forçado a recorrer a um prestamista – o  
Ambrósio - para solver as suas dívidas.
O especulador era um homem sem escrúpulos que só via o lucro à sua frente. Para fazer a transacção exigiu, como garantia, a hipoteca de  metade do valor da habitação.
Infelizmente, a sorte continuava arredia do pobre oleiro que não via  jeito de satisfazer a divida.
O ganancioso Ambrósio já esfregava as mãos de contente por antever a  possibilidade de se apropriar da bela propriedade. Por isso, recusou  ao Requelindo qualquer adiamento para o pagamento do empréstimo.
Atingido o fim do prazo o Ambrósio, detentor já de parte da casa,  
propôs ao Requelindo adquirir o restante do imóvel.
Amargurado, o pobre do oleiro viu-se obrigado a aceitar a venda da  moradia por um preço irrisório. Mas, à cautela, antes de firmar o  acordo final, resolveu impor uma condição:
- Qual é a condição que propões? Mais dinheiro não te dou. Quero-te é  longe da casa, ouviste?
- Não lhe peço mais dinheiro. Vendo-lhe a casa mas desejo prosseguir como dono do pequeno anexo do quintal, pois preciso continuar a  guardar ali os meus bonecos de barro e outras coisas.
- Olha, Requelindo, isso não me agrada nada. Mas aceito desde que não  venhas com muita frequência ao anexo. Que dizes?
- Não, não me servirei dele com muita frequência.
O Ambrósio, querendo acelerar o processo e não vendo grande  
inconveniente na cedência da pequena barraca, concordou com a proposta.Assinaram o contrato de venda perante o notário no qual figurava a  cláusula restritiva da propriedade.
Satisfeitíssimo, o Ambrósio instalou-se na sua nova casa com toda a  família, usufruindo, deliciado, da vista deslumbrante e da fresca  
brisa marítima.
Um belo dia, apresentou-se o Requelindo e pediu para se dirigir ao anexo.
- Com certeza, amigo, entra! – acedeu prazenteiramente o proprietário.
O Requelindo acercou-se do pequeno anexo e nele depositou um embrulho.
Umas semanas mais tarde, regressou com uns sacos de plástico e uma bilha.Na vez seguinte, chegou com uma porção de peles de coelho, ainda por curtir.
- Estas peles são para levar ao curtidor – disse ele ao Ambrósio que  já não estava nada satisfeito.
Passado algum tempo, o Requelindo volta à vivenda transportando um  monte de peles mal cheirosas.
- Ó Requelindo, também vais pôr isso no anexo? Olha que as outras  peles ainda aí estão e deitam um cheiro pestilento…
-Não tenho outro sítio onde as guardar até que vá ao curtidor –  
responde o oleiro.
- Mas o cheirete vai aumentar e as moscas já me invadem a casa. Começa  a tornar-se intolerável a situação. Tens que retirar todas as peles  rapidamente senão chamarei a polícia – ameaçou o avarento.
- Faça como entender. Limito-me a utilizar a minha propriedade –  
rematou o Requelindo.
A polícia chamada, deu razão ao oleiro.
Daí a algum tempo o oleiro volta com mais peles verdes, horrivelmente fedorentas.
O cheiro era de tal forma fétido que o infeliz do Ambrósio, impedido  de actuar legalmente contra o oleiro, não teve outro remédio senão  abandonar a casa.
E, para não perder tudo, vendeu a casa ao Requelindo por um preço  ainda mais baixo do que comprara.

Desta historieta ficcionada podemos extrair três conclusões:
A primeira reporta-se ao comprador da casa. O Ambrósio revelou-se um  homem insensível ao apelo do oleiro para lhe prolongar o prazo do  pagamento da dívida. Foi ganancioso e oportunista, receando perder a  oportunidade de, por pouco dinheiro, ficar com a apetecida propriedade.
A estratégia concebida pelo oleiro obrigou-o depois a abandonar a  
casa. E, assim, se repôs a justiça moral deste caso.
A segunda conclusão aponta para a esperteza do Requelindo que,  
vendo-se explorado pelo agiota, arquitectou um sábio estratagema,  
juridicamente inatacável, que lhe devolveu a propriedade e infligiu  uma justa lição ao especulador.
A última conclusão leva-nos a meditar sobre a insensatez do usurário  ao aceitar partilhar a casa. Foi alarve ao negligenciar a segurança do  negócio que, por essa razão, se veio a revelar ruinoso. Esta atitude  
alerta-nos para as facilidades que por vezes, inadvertidamente,  
facultamos aos outros e que nos veem a sair ruinosas.
Por exemplo, ainda recentemente, um jovem comerciante de Ferragudo  (Algarve) aceitou ser fiador dum equipamento de milhares de euros  adquirido por um cidadão  “amigo do peito”. Na altura de  pagar o encargo o “irmão” trapaceiro zarpou, (que é como quem diz, foi para outro país), deixando o fiador numa melindrosa situação económica. Muitos são os casos idênticos a  
este que sucedem às pessoas de boa vontade. Não se rejeita,  
obviamente, a ajuda solidária a alguém necessitado de auxílio.
Mas, é prudente averiguar, com rigor, a situação a quem se credita  
para não sermos vítimas de desagradáveis surpresas.
Aceitar a partilha de uma propriedade revelou-se ruinoso para o  
confiante comprador.
É bom aprender a dizer não! Quando se sabe negar, dizer sim tem um  gosto mais saboroso. 
                                                        Carlos Brandão de Almeida

2019.03.11




quarta-feira, 13 de março de 2019


VIAGEM DE COMBOIO COM MULHERES DE TODAS AS ÉPOCAS(artigo de Celeste Cortez, já publicado em Antologia e dito no dia da Mulher na Actis em 2013. No meu livro a publicar “M.E.” . E porque a minha neta KARINA faz anos hoje, dia 8 de Março, vou inclui-la neste artigo, aproveitando para falar das minhas filhas e das outras netas.   
Cada mulher é um ser diferente, mas todas contribuíram e contribuem, para a História da Humanidade. Vamos aqui recordar algumas abrangendo todas as mulheres universalmente, embora pelo pouco tempo que disponho, mencione mais a mulher de PORTUGAL. 
Deixando para trás civilizações, iria começar por falar a partir da era cristã, lembrando MARIA, Mãe de Jesus Cristo, mas fiquei perplexa e perguntei-me: Quem és tu mulher, para falares sobre Maria, quando há mais de dois mil anos escritores e poetas, gente rica e gente humilde, dela têm escrito e falado? E se falar na Rainha Santa Isabel de Portugal, lembrando a lenda que diz que levava esmolas para os pobres no seu regaço? Quantas rainhas ou plebeias o fizeram e o fazem ainda nos nossos dias? Não esmolas de amor visíveis, mas de amor que se reparte sem que a mão direita veja o que a mão esquerda distribui.
Como gosto de poesia e escrevo alguma, lembrei-me de Florbela Espanca, Natércia Freire, Fernanda de Castro, Marta Mesquita da Câmara, Natália Correia,  e não ficaria por aqui  se … 
Embalada pela beleza da poesia não embarcasse no comboio da mulher, onde numa carruagem se fez teatro com Palmira Bastos, Amélia Rei Colaço, Beatriz Costa, e filmes com a linda atriz Milú e tantas outras.
Apurei o ouvido. Não me enganei, ouvi cantar: a Severa, Amália Rodrigues, Dulce Pontes, Mariza e tantas outras que cantando, ajudaram ou ajudam a colocar bem alto o nome deste nosso belo Portugal, país plantado num canteirinho florido à beira mar, como se de uma tela pintada pelas mãos diáfanas das nossas pintoras Maluda (1934-1999) ou Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992), se tratasse.
Entro noutra carruagem: Mesas decoradas com Sabedoria, Paixão, Amor, Desespero, Emoção, tudo o que é necessário para o Conhecimento, estão dispostos livros das nossas escritoras: Agustina Bessa Luís, Alice Vieira, Maria Velho da Costa, Maria Teresa Horta, Lídia Jorge, Maria Helena Sacadura Cabral e tantas que seria impossível mencionar.
E não precisei de passar para outra carruagem porque mesmo nesta ouvi tocar melodias que me encheram o ouvido. É que há mulheres, tanto em Portugal como no mundo inteiro, que compõem partituras musicais e outras são cantoras e regentes de orquestra.
Ouço hinos angelicais, o doce nome de Madre Teresa de Calcutá, uma das líderes espirituais mais reconhecidas e amadas em todo o mundo, pelo seu trabalho a favor dos pobres, dos doentes, dos seres que eram despejados nas valetas.
           – Quantas Madres Teresas de Calcutá por esse mundo fora? 
- Quantas mais serão precisas para dar uma morte digna a todos os sem abrigo?
O comboio da mulher levou-me a correr o mundo. Sem me apear, passei por todas as mulheres, de ontem e de hoje, que não podemos deixar no esquecimento. A dona de casa, a operária, a empregada, a patroa, a aviadora, a fundadora de instituições, a professora seja das primeiras letras, passando por outras até chegar às universitárias, as minhas filhas SAMI,  BÉZINHA e LUÍSA, mulheres de grande valor nos cargos que ocupam e como esposas e mães extraordinárias. A minha neta KARINA engenheira química que trabalha em petróleos, a NADINE, mãe de um rapaz e uma menina (vivas a este dia BISNETA ELENA), ocupando um lugar de engª. Bio-tecnológica em grande empresa, no estrangeiro, a Tânia que dá aulas de motricidade humana numa escola de curriculum português, com 600 alunos, no estrangeiro, a Sara, mulher do meu neto Michael, já com um filho e à espera de uma menina, professora de português num país longínquo e desempenhando um lugar importante por turnos na Clínica Médica que a minha filha, sua sogra, dirige. Enfim mulheres de valor, sem elas o mundo não funcionaria do mesmo modo. 
Emocionei-me ao pensar na mulher que mal sai do sono da noite, corre na maratona da vida, para aprontar o pequeno-almoço para o marido e filhos. Tem de levar os filhotes à escola e numa corrida contra relógio chegar a tempo ao emprego. Desempenha as tarefas com eficiência. Tem um cérebro de génio para pensar nas compras que irá fazer para as refeições dos que ama e que irá preparar no seu regresso. E - quantas vezes - esses “se esquecem” de num abraço lhe agradecer, como se ela fosse uma peça sempre impecável da tecnologia mais avançada.
Não podemos deixar passar este dia dedicado à mulher, sem um pensamento doce de GRATIDÃO para as mulheres que ajudaram a moldar a nossa mente, o nosso coração:
As nossas mães estejam onde estiverem.
A todas as mulheres, incluindo as aqui presentes e a todas as que não estão aqui, dignas de referência, porque carregaram dentro de si o ser humano de que é composta a humanidade. E também em louvor de todas as mulheres que estão dando à luz e a todas as que estão nascendo neste momento, por esse mundo fora:Juntemos as nossas mãos numa calorosa salva de palmas.
Celeste Cortez (Portugal) escritora
Blogue: Letras à solta - http://celestecortez,blogspot.com/


COMENTÁRIO AO ROMANCE "MÃE PRETA" de Celeste Cortez


MÃE PRETA – ROMANCE
Do Blogue:"Farol da Nossa Terra", extraímos com a devida vénia:  

…”Este romance apresenta uma perspectiva extraordinária da História e das estórias que se cruzaram ao longo de muitos séculos de presença lusófona no Continente Africano.
 
     Marcado pelas cores fortes que África imprime, o romance “Mãe Preta” dialoga de forma permanente com os arquétipos mais profundos da humanidade, repescando emoções, sensações e memórias que são transversais à História mais ancestral do Ser Humano. Os tons sépia dos retratos que Celeste Cortez traça de forma magistral na paisagem Africana, envolvem uma estória onde o amor e o humanismo se misturam num quadro onde este enredo e esta história excepcional se cruzam.

     Detentora de uma forma escrita onde a limpidez descritiva é a característica principal, Celeste Cortez apresenta neste “Mãe Preta” uma história que não deixa indiferente quem tiver a sorte de a poder apreciar.

      Lê-se de um só fôlego e carrega consigo uma memória profunda de conhecimentos. 


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