VILA PERY - mais propriamente na aldeia indígena
próximo da Cabeça do Velho:
próximo da Cabeça do Velho:
..."Levantei novamente a cortina e olhei lá para fora. Na aldeia sem luz, só quando a noite começa a dar a mão à madrugada, se consegue ver a frondosa ACÁCIA e as mangueiras que, em noites de vento, projetavam caretas nas paredes da casa de minha mãe, nas palhotas da aldeia e no chão do terreiro, que assustariam as crianças que espreitassem e, talvez, até os adultos que a essa hora passassem por ali.
Felizmente que a aldeia dormia ainda e, só duas ou três horas mais tarde, os mais madrugadores, os que trabalhavam no turno das seis da manhã nos caminhos-de-ferro, abririam a porta da palhota, devagar, bem devagar, para não acordar as crianças que, àquela hora, ainda sonhavam com os anjos.
Será que os meus meninos pretos sonhariam com anjos brancos? Não teria de me preocupar: eu sabia que também havia santos pretos, então teria de haver anjos pretos também. E haveria de certeza um Deus preto, se Deus era para todos os povos, os pretos tinham direito ao seu. Porquê preocupar-me? De resto, já me chegava a preocupação com a minha querida mãe, que toda a noite ardera em febre e nem o Xicwembo nem o Deus dos brancos lhe tinham valido até agora. A senhora grande e a senhora pequena, diziam que Deus era só um para toda a gente. Era pouco, era trabalho a mais para uma pessoa só.
Ouvi mais uma vez uma voz dentro de mim a dizer-me: Lina, tu estás revoltada pela rejeição do teu marido, pela falta de filhos, pela morte do teu pai, pela doença da tua mãe, porque já ouviste dizer muitas vezes que Deus é Um ser Omnipotente. Acredita, tens de acreditar.
Com lágrimas nos olhos, encostei-me à janela e levantei a cortina para espreitar novamente se a luz já se vislumbrava no horizonte, mas pareceu-me que não tinham sido acesas as velinhas com que os anjos dormiam de noite, para não terem medo do escuro, e a mãe dos anjos também ainda não tinha acendido o petromax. Continuava escuro.
Será que a mãe dos anjos, a quem os brancos chamam Nossa Senhora, se zangaria por eu ter pensado assim? Ela sabia que eu gostava dela, era só por pensar que lá no céu, também não havia iluminação eléctrica, como na minha aldeia". ....
(O extracto é do romance MÃE PRETA, autora Celeste Cortez, a sair em Setembro 2011). É o 2º. romance da autora a ser publicado, de alguns que tem para publicar.
O romance tem 448 páginas, 230x180. Com 28 capítulos e glossário línguas autóctones/português.
O livro poderá ser pedido a Celeste Cortez (no facebook). Será enviado à cobrança ou com depósito prévio através do NIB.
Imagem de http://www.flickr.com/photos/feitoamao/3040793337/
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