sexta-feira, 25 de março de 2016

UMA HISTÓRIA QUE SE PASSOU PELA PÁSCOA...

UMA HISTÓRIA QUE SE PASSOU PELA PÁSCOA, por Celeste Cortez
O Inácio, os padrinhos e as amêndoas da Páscoa
Numa aldeia pertencente a Carregal do Sal, já lá vão muitos e muitos anos, andará à volta dos setenta e tal anos, esta história aconteceu. Estará narrada com jeitinho de escritora, para lhe dar maior autenticidade. Foi o próprio que ma contou há alguns anos:
O Inácio era afilhado de meu tio Inácio, por isso o seu nome, que era irmão de minha mãe. A madrinha era minha mãe, Georgina de nome, na altura desta história já casada, evidentemente com meu pai Artur.
O Inácio, hoje um homem de certa idade, que vive na sede do concelho da sua e minha terra, quando era pequeno não era muito abastado. Os pais tinham vindo trabalhar para Lisboa e deixaram-no na terra com uma avó para que frequentasse a escola e os pais pudessem mais facilmente granjear a sua vida na grande cidade.
Meus pais, uns tempitos antes da Páscoa, mandaram-no chamar. Minha mãe ou meu pai, um deles, pegou numa fita métrica, foi tirando medidas ao seu corpo de menino que frequentava a primeira ou a segunda classe escolar e tirando apontamentos.
Notava-se na sua face de menino já por si corado pelo sol que o ia queimando quando ele andava a ajudar a avó na vindima, ou em outras tarefas na sua propriedade, que o Inácio estava feliz, parecia não caber em si de contente.
Mal os padrinhos lhe disseram: “pronto Inácio já podes ir” ia desatar a correr escadas abaixo, mas minha avó que estava por perto, chamou-o meigamente: “então Inácio, não te despedes dos padrinhos? Esqueceste que tens de lhes pedir a bênção”? (costumes da educação da época).
O Inácio, meio envergonhado, mas sem perder o seu ar gaiato, lá ergueu as mãos pedindo para ser abençoado pelos padrinhos. E logo que minha mãe a sorrir lhe disse: “vai vai, menino”, o Inácio quase que voou pelas escadas. Correu até ao terreiro onde encontrou outros rapazes da sua idade e afogueado disse-lhes com a maior alegria:
- Os meus padrinhos vão-me oferecer um cinto.
- Um cinto? Um cinto a sério?
- Sim, um cinto. O meu padrinho tirou-me as medidas à cintura.
- Daqueles cintos que os homens usam, Inácio?
- Sim um cinto, um cinto de cabedal. O meu padrinho usa um cinto de cabedal.
- Mas o teu padrinho é um senhor, trabalha nas Finanças. Já não é um rapaz como tu.  Para que queres o cinto de cabedal Inácio? Perguntou um que provavelmente segurava as calças sem cinto, mais justas – seriam do irmão a quem deixaram de servir? Ou usaria as calças atadas com um cinto de tecido da cor das calças? Ou até só atadas com um cordel?
- Ora! O meu padrinho também usa cinto. Cinto de cabedal. É porque é bonito usar cinto.

 Suponho que naquela época poucos meninos da escola teriam um cinto de cabedal, pelo que a alegria se justificava. Todos ficaram admirados.
- Os teus padrinhos são ricos, Inácio, disse o Tóino da Eira.
- Tiveste sorte com os padrinhos que tu escolheste, disse o Zé, filho do Joaquim da venda.
- Mas eu não escolhi os padrinhos, foram… foram os meus pais que escolheram, ou os meus avós, sei lá!...
- Pois então quem te escolheu os padrinhos, escolheu muito bem, acrescentou  o Manel.
- Eu também gosto deles, respondeu com voz alegre o Inácio.

No domingo de Páscoa o Inácio galgou os degraus dois a doisda casa da Dona Amabília, mãe dos seus padrinhos, com a pressa e a alegria estampada no rosto, por ir receber o cinto de cabedal. Depois de ter cumprimentado e pedido a bênção aos padrinhos,  recebeu um embrulho com  umas calças de bom tecido.
 Quase a gaguejar apesar de não ser gago, mas como não era o que esperava e não queria passar por mentiroso aos olhos dos seus amigos da escola, atreveu-se a dizer, em voz baixinha que a madrinha mal ouviu:
- Pensei que ia receber um cinto de cabedal. E um pouco esmorecido: Afinal são umas calças.
- E não ficas satisfeito por receberes umas calças. Tens muitas?
- Não senhora madrinha. Mas eu tinha dito “ós” outros rapazes, que ia receber um cinto.
A madrinha, a achar graça à conversa do miúdo, quis prolongá-la, enquanto o padrinho ao lado, não conseguia conter o riso. Retorquiu-lhe:
- Inácio, pelo que disseste, parece que ficavas mais satisfeito se fosse um cinto. Mas podes escolher.
- Escolher, como?
- Volto a receber as calças e dou-te um cinto. É isso que queres? O que preferes?
- Senhora madrinha Georgina, eu, eu preciso mais das calças. Elas são muito bonitas.
- Então leva as calças. E toma lá este outro embrulhito oferta do Padrinho.
O Inácio abriu freneticamente o outro embrulho. E qual não foi o seu espanto quando viu que era um cinto de cabedal. A alegria era tanta, que para dar a novidade aos amigos, virou as costas aos padrinhos sem se despedir. Mas a madrinha chamou-o à atenção que isso não eram boas maneiras…

 - Ainda não te demos as amêndoas da Páscoa e para isso é que cá vieste, para receberes o folar da Páscoa. Ora o folar, o ano passado foi…
E o Inácio não se contendo atalhou rapidamente:
- Foi o casaco, porque ia para a escola.
- Receber o casaco e agora as calças e o cinto, é porque és um bom rapaz que ajudas a tua avó e és educado e bom estudante. Assim os padrinhos gostam muito de ti. E toda a gente gosta de ti por seres um bom rapaz. Mas as amêndoas e o bolo, é que são o Folar da Páscoa. 
Aqui neste saquito tens as am êndoas e o bolo, ofertas dos padrinhos, que é a tradição receberem-se na Páscoa. 
            E o Inácio, um pouco atrapalhado, sem saber o que dizer, lá conseguiu articular “a sua benção minha madrinha”, “a sua bênção meu padrinho”.
E foi vê-lo a saltar as escadas duas a duas com a alegria, e os padrinhos preocupados não fosse ele cair e magoar-se. O Inácio era ainda uma criança. 


Espero que os meus leitores tenham gostado desta pequena história. Porque não me contam uma história passada convosco? Deixam no lugar dos comentários. Eu irei lê-la com certeza. Se me deixarem o vosso email, responderei. Valeu? Combinado? Fico à espera. 
Aproveito para vos desejar, assim como à vossa família UMA PÁSCOA MUITO FELIZ.  Abraço da Celeste Cortez 

Celeste Cortez, escritora de romances, literatura infantil e poesia. (Portugal). 

        
 


1 comentário:

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